Ein feste Burg ist unser Gott
Estas palavras difíceis de pronunciar para a vasta maioria dos falantes de língua portuguesa, entre os quais nos incluímos, foram as que Martinho Lutero (1483-1546) redigiu na sua língua natal, o alemão, para primeiro verso de um poema que, depois de musicado, se viria a tornar naquele que é o mais famoso e icónico hino da Reforma Protestante iniciada no século XVI, que conhecemos em português como Castelo Forte é Nosso Deus.
Lê-se e ouve-se com alguma frequência que esta composição terá sido produzida quando o reformador se encontrava detido, embora para sua proteção, pelo príncipe Frederico, o Sábio (1463-1525), da Saxónia, precisamente no Castelo de Wartburg, durante os tempos mais quentes da afirmação de Lutero, logo a seguir à sua excomunhão e à sua proscrição pelo imperador Carlos V (1500-1558) do Sacro Império Romano-Germânico, na sequência da Dieta de Worms em 1521.
É certo que esta estadia forçada de Lutero nessa fortaleza por cerca de um ano, durante a qual completou a tradução do Novo Testamento para a língua alemã, o poderá ter inspirado a produzir este hino de combate, mas todas as fontes apontam para que a sua escrita e composição só tenha ocorrido muitos anos depois, mais concretamente em 1529.
Sendo claramente um hino de combate, ao longo das suas estrofes o reformador alemão expressa com determinação a sua coragem e a de todos quantos enfrentaram o statu quo político e religioso da época.
Embora a melodia seja atribuída ao próprio Martinho Lutero, alguns historiadores e musicólogos falam na possibilidade de ter constituído uma adaptação de uma música popular da época.
Não obstante, a marca de Lutero está muito presente tanto na composição quanto no poema que é assumidamente inspirado no Salmo 46, que inicia com as palavras “Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente na angústia”.
O texto saído da pena de Lutero é uma exaltação eloquente da confiança que o crente deve ter em Deus mesmo nos momentos mais difíceis e turbulentos que possam passar pela sua vida.
Pela fé, e só pela fé, como deixa bem vincada a teologia luterana, o crente pode estar seguro em Deus independentemente de quaisquer ameaças, perseguições ou tormentas.
Martinho Lutero escreveu muitos outros hinos que infelizmente a maioria dos evangélicos desconhece. Em boa verdade, a sua prolixidade manifestou-se não só em obras teológicas – no total são mais de oitenta mil páginas os textos atribuídos a Lutero que foram sendo coligidos ao longo de mais de um século, cuja edição crítica só foi completada em 2009 – como também através desta feição artística do reformador.
Ainda assim, nenhum outro hino para além do Castelo Forte, desempenhou um papel tão significativo não só no desenvolvimento do protestantismo como na história da música religiosa moderna.
Tim Cavaco